Nos últimos meses, foram muitos os desafios enfrentados pelo produtor diante dos impactos climáticos nas lavouras. Cafeicultores ainda colhem a retração causada pelas geadas em 2021. A safra de verão de soja foi marcada pelo tempo seco, com efeitos negativos nas regiões Sul, centro-oeste e sul de São Paulo e sul do Mato Grosso do Sul. O retorno das chuvas foi alegre para o milho safrinha, mas atrasou a colheita da soja gaúcha, com severa repercussão na semeadura do trigo de inverno.
Em muito, as condições climáticas adversas que desestabilizaram os planejamentos do produtor rural ocorreram por conta do La Niña, um fenômeno natural que altera os padrões de precipitação por conta da redução da temperatura na superfície do Oceano Pacífico. Porém, em conversa com o meteorologista da Rural Clima, Alexandre Nascimento, o especialista afirmou: “Pelo nosso entendimento, o fenômeno tende a se desfazer por completo até dezembro”.
Nascimento demonstrou ainda uma perspectiva otimista para a agricultura, com previsão de chuvas dentro da normalidade para a próxima temporada de cultivos, e chama a atenção para a importância de uma análise climática que vá além dos efeitos do La Niña, para uma tomada de decisão mais assertiva no campo:
“Ainda estamos em La Niña, mas nos últimos meses os seus efeitos foram mínimos. Ou seja, o retorno da chuva foi potencializado por outras variáveis, como a oscilação Antártica (AAO), a oscilação Maden Julian (MJO) e o efeito do próprio Atlântico. O resultado foi o excesso de chuva, as ondas de frio no outono e a ausência de frio no inverno, mesmo sob domínio do La Niña. Isso só reforçou o que a Rural Clima vem falando há anos: fazer previsão de clima não é só olhar para o Pacífico!”
5 consequências das condições climáticas percebidas nas lavouras
O mês de agosto inicia com expectativa de estabilidade climática, com chuvas regulares e predomínio da estiagem já esperada para este período do ano, além de uma leve queda na temperatura. Como isso, somado às condições climáticas dos últimos meses, influencia as lavouras e as operações agrícolas é o que será destacado a seguir.
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2. O jogo pode virar nas lavouras de café
As perdas causadas pelas atípicas geadas nas principais regiões produtoras de café em 2021 ainda tomam conta do pensamento do produtor rural. Cafeicultores buscam alternativas para recuperar não só o investimento perdido nos talhões destruídos pelo frio intenso entre junho e agosto de 2021, mas também os índices de produtividade na colheita que segue em andamento e na próxima florada.
Tudo indica que nenhum desafio climático que possa vir a ocorrer neste segundo semestre causará impactos tão hostis quanto os do ano passado. Segundo Alexandre Nascimento, a ausência de geadas em 2022 pode oferecer efeitos positivos para as lavouras e para o mercado de café em 2023.
“A chuva neste ano deve vir na hora certa nas principais regiões produtoras de café. Isso, somado ao fato de que não tivemos geada no café neste ano, deve gerar um efeito positivo para a próxima florada”, afirma o especialista.
Cafezais atingidos por geadas em 2021. Fonte: Revista Cafeicultura, 2021.
2. Clima tende a ser favorável para colheita e moagem da cana
O fator climático que mais influenciou o setor canavieiro foi a seca na região Centro-Sul entre março e abril de 2022. A condição incomum para o período interferiu na quantidade e na qualidade da cana colhida em localidades responsáveis por grande parte da produção nacional. Canavicultores já estavam em alerta, uma vez que também foram afetados pelas geadas do ano passado.
Felizmente, o mês de junho já apresentou mudanças favoráveis para a cultura e a cadeia sucroenergética, com recuperação da produtividade e avanço no processo de moagem.
A entrada de agosto é ainda mais promissora, cujo típico clima mais seco tem previsão de ser estável, facilitando o encaminhamento das operações canavieiras.
3. Milho safrinha seguirá firme e forte
Apesar de o milho verão ter sido afetado pela restrição hídrica que dominou a região Sul entre o fim de 2021 e o início de 2022, a estimativa é de uma produção total do grão 32,8% superior à safra anterior, dado que se confirmará ao final da colheita, que está próxima ao fim para o milho primeira safra e já avança em mais da metade para o safrinha.
A estabilidade climática verificada neste inverno favoreceu as operações, embora algum atraso tenha ocorrido devido às inesperadas chuvas em determinadas regiões produtoras. De toda forma, o milho safrinha parece ser a estrela deste ciclo: além de apresentar ótimas produtividades, as condições climáticas para a colheita em agosto tendem a manter a qualidade do grão elevada, com a redução da sua umidade ocorrendo de forma natural nas lavouras e a manutenção do ritmo de colheita.
Os resultados positivos são inegáveis no Mato Grosso, Estado responsável por 45% da produção total de milho segunda safra prevista no país. A expectativa é de 40.863,9 mil toneladas no MT, número favorecido pelo clima nesta etapa final das operações nas lavouras, ainda que o rendimento tenha sido inferior em áreas afetadas pela seca de abril, que interferiu no desenvolvimento das plantas em estádio de enchimento de grãos.
Ligeira queda de produtividade também pode ser notada em Minas Gerais, Goiás, São Paulo e Bahia, cujas lavouras de milho safrinha sofreram com a restrição de chuvas. Mesmo assim, a produção se mantém firme e forte, pelos bons resultados esperados em algumas áreas do Mato Grosso e em outras regiões que tiveram volume e distribuição de chuvas dentro do ideal.
4. Atraso na colheita da soja e na semeadura de trigo de inverno no Sul
Enquanto Centro-Sul e Nordeste avançam na colheita do safrinha, o Rio Grande do Sul é impactado pela abundância de chuvas, que atrasou a colheita de soja e, consequentemente, a semeadura do trigo de inverno.
Tendo em vista a proximidade do fim do vazio sanitário da soja no Estado, cuja janela de plantio para a safra 2022/23 está prevista para se abrir em 11 de outubro, alguns produtores desistiram de seguir com o plantio do trigo, a fim de evitar maiores consequências no próximo ciclo da soja.
Isso porque o excesso de chuvas causaria uma reação em cadeia: paralisação das operações de colheita da soja implica em atraso na implantação das lavouras de trigo, que estenderia o prazo para colher o cultivo, impedindo que a safra verão de soja fosse semeada em período ideal.
A fim de diminuir os riscos do ciclo produtivo da soja 2022/23 e garantir produtividades mais elevadas, o trigo de inverno ficou em segundo plano na estratégia dos produtores, que estão em alerta para driblar possíveis novos desafios climáticos que venham a interferir nas produções. Algo necessário para recuperar os estoques diante da quebra de safra vivida na região em 2021/22.
5. Quebra de safra no Rio Grande do Sul
Ondas de frio avançam pelo RS na última semana de julho. Fonte: Simepar, 2022.
O Rio Grande do Sul foi o mais impactado pelos efeitos do La Niña, uma vez que o Estado fica localizado em área fortemente afetada pela entrada de massas polares. Trigo, soja, milho, café e cana foram as culturas mais prejudicadas, com reverberações no mercado amplamente percebidas pelos consumidores.
Por outro lado, os mesmos produtores tiveram condições melhores na segunda safra de 2022, quando comparado, por exemplo, aos produtores de Goiás e de Minas Gerais. Isso significa que o fenômeno climático tende a influenciar cada vez menos os cultivos.
“Se o La Niña continuar com efeitos fracos e mantiver a tendência de saída no final do ano, os produtores do Sul devem ter uma safra de verão melhor do que a anterior”, comenta Alexandre Nascimento.
Impactos climáticos nas lavouras devem amenizar a partir de agosto
Em resumo, agosto é o mês mais seco na maior parte do Brasil, condição que deve favorecer as áreas de cana em colheita e moagem no Centro-Sul do país e a colheita do café. Já no Sul, o mês de julho foi mais seco que o normal e muito quente. A chuva volta a ser regular em agosto e o tempo esfria um pouco – sem geadas significativas para as regiões produtoras.
O meteorologista da Rural Clima completa as previsões climáticas levando em consideração a grande preocupação dos produtores em relação à restrição hídrica:
“Não chover nesta época do ano é completamente normal. Queimadas entre julho e setembro é praticamente uma regra. A grande questão é se volta a chover a partir de meados de setembro.”
Espera-se que a próxima temporada tenha chuvas dentro do padrão de normalidade no Centro-Oeste, no Sudeste, no Norte e no Nordeste, acontecendo em período próximo ao final do vazio sanitário de cada região. Essa previsão é otimista para os agricultores, que vinham sofrendo com as instabilidades climáticas nos últimos dois anos, por conta do atraso das precipitações em 2020 e da antecipação das chuvas em 2021.
“Ainda poderemos ter chuvas irregulares no Sul, por conta de um finalzinho de La Niña, mas nada comparável à safra 2021/22”, afirma Nascimento.
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